Quando escrevi o primeiro artigo “O jovem e a religião” não imaginava que se abriria aí uma oportunidade singular de reflexão acerca desta instituição tão importante e indispensável para o desenvolvimento correto de uma sociedade: a Família.
No mês passado discorremos um pouco sobre qual o papel dos pais na educação e formação dos filhos neste século XXI. Sabemos que os desafios vão muito além das questões ali levantadas, mas não há duvida alguma que aqueles pontos também são fundamentais.
Bem, de acordo com o combinado neste mês estudaremos um pouco sobre o tema: Perdão que constrói. Amor que une. Será que alguma vez na vida, você amigo leitor, amiga leitora já não passou por alguma situação em que tendo sido ferido(a) diretamente na alma, sentiu o seu mundo se desmoronar e uma dor terrível – impossível de ser expressada em palavras – fez você achar que nunca, que jamais seria capaz de perdoar tal pessoa? Ou que não tenha sentido na pele que às vezes a vida nos parece injusta demais, onde alguns poucos têm muito e muitos têm pouco?
A maioria de nós já viveu esta experiência pelo menos uma vez na vida. Por que será que é tão difícil perdoar? Porque a pessoa em questão não é qualquer uma, trata-se de alguém muito importante para nós, pois só nos magoamos ou odiamos, quando nos decepcionamos profundamente com este alguém. O prof. Kamino Kussumoto nos fala em seu livro Buscando o Amor dos Pais, que ninguém odeia a mulher do vizinho que o trai, mas se sua própria mulher te trai você acaba odiando-a. Isso ocorre porque você a ama e ela é muito importante na sua vida.
No mesmo livro aprendemos também que o ódio é o lado oposto da mesma moeda, onde de um lado se tem o amor e do outro o ódio. Quanto maior o ódio, maior é o amor que sentimos por esta pessoa.
Algo parecido ocorre também nas demais relações humanas, como pais e filhos, cônjuges, entre irmãos, amigos, etc. Quando amamos alguém há certa tendência em esperarmos muito desta pessoa, muitas vezes sem que percebamos, acabamos exigindo dela uma perfeição idealizada. Por isso, quando esta comete alguma falha nos decepcionamos, nos sentimos “traídos” como vítimas de uma tremenda injustiça.
Outro aspecto a ser considerado é o fato que para se perdoar alguém, necessariamente teremos que “abrir” mão de nosso “direito” e de nossa “razão”. Quando analisamos “certos” acontecimentos na vida, de fato há situações em que a pessoa realmente tem razão e até mesmo o direito de guardar profunda mágoa, inclusive ódio. Mas naturalmente, se analisamos nossa vida apenas no aspecto físico, onde é possível precisar a data de nosso nascimento aqui na Terra.
Porém, a vida verdadeira, a vida que existe de fato, não é esta física. A vida verdadeira existia antes de nascermos e continuará existindo mesmo depois que nós morrermos. Para se perdoar é preciso subir mais um degrau e olhar para esta vida com uma visão mais ampla possível. Aí enxergaremos a Vida, a vida enquanto espírito imortal. Quando assim agimos, compreendemos que não nascemos apenas uma vez e que tudo no universo é regido pela lei de causa e efeito. Em outras palavras, a semeadura é livre, mas a colheita é obrigatória.
Quando analisamos de forma mais profunda, quando reflexionamos, quando meditamos acabamos concluindo inevitavelmente que não existe injustiça na extensão infinita da vida. Que o que estamos passando neste momento é na realidade reação das nossas próprias ações em um passado, às vezes, remoto. É por isso, que na oração para perdoar da Seicho-No-Ie oramos assim: “Eu o (a) perdoei e você me perdoou; eu e você somos um só perante Deus. Eu o (a) amo e você me ama também; eu e você somos um só perante Deus. Eu lhe agradeço e você me agradece; Obrigado... Obrigado... Obrigado...”
Ainda na mesma oração encontramos: “Já perdoei a todas as pessoas e acolho a todas elas com o Amor de Deus. Da mesma forma, Deus me perdoa os erros e me acolhe com Seu imenso amor”. Não lembramos, com raras exceções, o que aconteceu em outra existência, mas podemos concluir intuitivamente e até racionalmente que nada neste mundo ocorre como obras do acaso.
Assim, começamos a entender gradativamente que tudo nesta vida exprime sempre a misericórdia infinita de Deus. Que não há ninguém que se perca eternamente na escuridão. Que tudo o que fazemos é computado na nossa consciência, esse extraordinário agente de registro. Ela (a consciência), em toda a sua amplitude, ainda se manifesta sem que sejamos capazes de compreendê-la por inteiro e também que tudo aquilo que pensamos, falamos e fazemos fica registrado na mente cósmica e nas profundezas de nosso subconsciente e um dia deverá vir à tona. Por isso, é muito sério o que pensamos, falamos e fazemos. Mas, o mais importante é sentirmos que Deus não esquece ninguém, na Sua bondade sobremaneira infinita.
Em certa ocasião ouvi uma expressão que me emocionou muito: “O pecado é espada que quebra no escudo chamado perdão”. Lindo isso, vocês não acham?! Que profundo este pensamento. De fato, o perdão é uma dádiva divina que liberta o próximo, mas que também liberta a nós próprios. Aprendemos com o querido mestre Masaharu Taniguchi que é pecado é o encobrimento da Imagem Verdadeira e com Jesus Cristo que a Verdade nos tornará livre. Portanto, perdoar significa nos libertar de tudo aquilo que é indesejável, de toda dor, do sofrimento, da angústia, da solidão, do medo, da pobreza, da doença, etc.
E como sabemos se já perdoamos alguém? Quando nos lembramos desta pessoa e não mais sentimos dor ou desprezo, mas uma sensação de alegria e gratidão, pois finalmente compreendemos que no mundo da Imagem Verdadeira não existe aquele que fere, ofende ou trai, nem existe quem seja ferido, ofendido ou traído. E que esta vida atual é uma representação daquilo que viemos plantando a cada nova oportunidade que temos de aqui nascermos, seja no bem ou no mal, utilizando nosso livre arbítrio.
No final das contas, haveremos de concluir que aquela pessoa que nos parecia um malfeitor era na verdade “Cristo disfarçado”, umas das inúmeras manifestações de Kanzeon Bosatsu, a divindade da misericórdia na tradição budista, cuja finalidade era nos levar ao despertar espiritual e fazer manifestar em nossa através do perdão o Amor em sua manifestação mais sublime.
Ah! Não poderia concluir este nosso estudo, esta nossa reflexão deste mês sem afirmar que qualquer um pode alcançar este estado espiritual, pois se até eu o alcancei e procuro vive-lo a cada dia, aprendendo com as novas experiências cotidianas, imagina você Amigo Leitor? Então, pare de se lamentar e de se ver como pobre vitima e tome a iniciativa de se tornar neste instante o protagonista da sua própria vida, transformando-a através do perdão, pois o Perdão constrói e o amor une.
Muito obrigado!
Nenhum comentário:
Postar um comentário